Saúde disponibiliza cartilha no Dia Internacional dos Direitos Humanos

Terça, 10 de Dezembro de 2019 - 15:57

O Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado nesta terça-feira (10) – data em que há 71 anos a Organização das Nações Unidas (ONU) instituía a Declaração Universal dos Direitos Humanos – ficará marcado este ano em Guarulhos com o lançamento da Cartilha “Vamos falar de Equidade na Saúde!”. O evento aconteceu no último dia 8, dentro da programação do Aniversário de Guarulhos e o material já está disponibilizado no site da Prefeitura. 

Construída por 10 autores convidados, a cartilha tem por objetivo provocar a percepção coletiva sobre gênero e identidade de gênero, aspectos geracionais, etnicorraciais, culturais, de origem e condições sociais na dinâmica do processo saúde-doença, preparando os profissionais de Saúde para acolher as necessidades e vulnerabilidades, e valorizar as diversidades e potencialidades. 

Confira abaixo a íntegra de um dos textos da Cartilha, que chama a atenção para um tema do Programa Movimenta Saúde que é comemorado mundialmente este mês.

ZERO DISCRIMINAÇÃO E AS PESSOAS QUE VIVEM COM HIV/AIDS
 
Fabiola Santos Lopes [1]
 
As pessoas que vivem com HIV e AIDS enfrentam em seu cotidiano situações de discriminação em decorrência de sua sorologia. Esta discriminação ocorre nos mais diversos espaços utilizados e frequentados por elas.


Além do estigma enfrentado pela condição de serem soropositivas para o HIV, outras vulnerabilidades individuais e sociais podem dificultar ainda mais o acesso delas aos serviços. Características como cor, gênero, orientação sexual, credo, condições socioeconômicas aumentam ainda mais as possibilidades de vivenciar situações de discriminação, o que acaba por inibir essas pessoas a buscarem seus direitos. 

Vários avanços foram conquistados nas três décadas da epidemia de aids no Brasil, em especial para a prevenção e assistência às pessoas vivendo com HIV. Estratégias como PEP (Profilaxia pós-exposição), PrEP (Profilaxia pré-exposição), tratamento como prevenção e ampliação do acesso à testagem, possibilitaram um aumento no número de pessoas diagnosticadas e um aumento no número de pessoas com HIV inseridas nos serviços para tratamento e acompanhamento, tendo como resultado uma queda importante no número de adoecimentos e óbitos por aids. No entanto, estes avanços não impactaram num aspecto fundamental da epidemia, persistindo como uma barreira para um avanço ainda mais significativo. Este aspecto, considerado no início como a terceira fase da epidemia, caracteriza-se pelo estigma e a discriminação, que “são uma questão tão central para a aids global quanto a doença em si” (Mann, 1987). 

Também é importante considerar que não podemos dissociar os processos de discriminação para com as PVHIV/AIDS (Pessoas vivendo com HIV/aids), com processos discriminatórios mais amplos e históricos, que já existiam antes do aparecimento do HIV e da AIDS. Vulnerabilidades individuais/comunitárias como indivíduos pertencentes á população negra; indivíduos cuja orientação sexual e identidade de gênero diferem da heteronormatividade, em especial gays e homens que fazem sexo com homens, mulheres transexuais, homens transexuais e travestis; indivíduos de segmentos da população com indicadores socioeconômicos desfavoráveis (baixa escolarização, moradias precárias, baixa renda familiar, subemprego, população de rua); têm estreita correlação com o aumento da incidência do HIV e da AIDS. 

A partir da conceituação dos Determinantes Sociais da Saúde (DSS), foi possível dimensionar de forma mais qualificada os efeitos nocivos da discriminação sobre a saúde de determinados segmentos da população. Os DSS são os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população (CNDSS, 2006).

A desinformação, os preconceitos relacionados à infecção, a relação equivocada sobre moral e permissividade sexual presente no imaginário das pessoas, influenciam a conduta de profissionais das mais diversas áreas, inclusive os da saúde.

Duas proposições são necessárias para enfrentar e superar as barreiras de acesso impostas para as PVHIV/AIDS. Uma delas é a informação. Conhecer as formas de transmissão, as estratégias de prevenção e os avanços no tratamento, é com certeza uma importante ferramenta para lidar de forma eficaz com os medos, reais ou imaginários, que permeiam determinadas condutas profissionais.

A transmissão do HIV se dá por meio de troca dos seguintes fluídos corporais: sangue, sêmen, secreção vaginal e leite materno. Lembrando que o HIV não sobrevive por tempo prolongado fora do organismo, além de não se reproduzir nesta situação. E a transmissão só se dá se houver uma “porta de entrada” para a corrente sanguínea (cortes e lesões abertas de pele e micro ferimentos nas regiões de mucosas). Contato social, abraços e beijos, compartilhamento de utensílios, não trazem nenhuma risco para a transmissão. 

Com relação à prevenção, contamos atualmente com amplas possibilidades de evitar a infecção. Além dos preservativos penianos (utilizados no pênis) e dos preservativos internos (utilizados na vagina e no ânus), métodos extremamente eficazes na prevenção, quando utilizados de forma correta e constante, estão disponíveis medicamentos para evitar a infecção nos casos em que houve exposição à situação de risco (PEP) ou para manter o organismo em estado de proteção antes mesmo de exposição a situação de risco (PrEP). Além disso, já é consenso universal (comprovado por diversos estudos) que as PVHIV que estão em tratamento e que os níveis de HIV no sangue estão indetectáveis, deixam de transmitir o vírus, mesmo nos casos de relações sexuais desprotegidas. 
A outra proposição, ainda mais importante e relevante, é a constante reflexão dos profissionais sobre seus próprios preconceitos. O Sistema Único de Saúde (SUS) está baseado em um conjunto de princípios – universalidade, integralidade e equidade – que assegura a todos, indistintamente, o igual direito a utilização de seus serviços. É direito constitucional, e a barreira de acesso enfrentada pelas PVHIV/AIDS, além de inaceitável quando praticada por profissionais que têm a obrigação ética de acolher e cuidar da saúde da população é também criminosa, passível de penas que vão de multa à reclusão (Lei Federal nº 12.984/2014).

É importante não apenas estar constantemente vigilante sobre as próprias condutas, como estar pronto para enfrentar e combater as condutas discriminatórias de outros profissionais e da população em geral. Conceitos como “transmissão criminosa” (em que supostamente uma pessoa infectada transmite intencionalmente o vírus para outras pessoas), “grupos de risco”, “doença pecaminosa”, devem ser desmistificados e esclarecidos, a fim de garantir a integridade e a dignidade da pessoa humana para as PVHIV/AIDS. 
 
BIBLIOGRAFIA
Diretrizes para implementação da rede de cuidados em IST/HIV/AIDS – Manual de Prevenção CRT – DST/AIDS. CCD., Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, 2017.

PARKER, R. Introdução. AIDS, a tercei¬ra epidemia: ensaios e tentativas. 2ª ed. Rio de Janeiro: ABIA, 2018. Disponível em: <http://abiaids.org.br/wp-content/uploads/2018/12/ aids_a_terceira_epidemia_web.pdf>

COMISSÃO NACIONAL SOBRE OS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE (CNDSS). Carta aberta aos candidatos à Presidência da República. Setembro de 2006. Disponível em: www.determinantes.fiocruz.br.    

Lei nº 12.984, de 2 de julho de 2014. De¬fine o crime de discriminação dos portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e doentes de Aids. Portal da Câmara dos Depu-tados.  Disponível em: <bit.ly/2D0k2Xf>.